sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

NÃO É PRIVATIZAÇÃO O CARALHO




HORA DO POVO

Ministro da Fazenda garante que não haverá mais leilões para privatizar aeroportos no país

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, negou na quarta-feira (8) que o governo esteja “pensando neste momento em seguir privatizando outros aeroportos como o do Rio de Janeiro (Galeão-Tom Jobim) e de Confins, em Minas Gerais”. “Vamos consolidar aquilo que está sendo feito”, afirmou. A declaração foi feita depois dos diversos “elogios” recebidos das hostes neoliberais e de tucanos como FHC, Mendonça de Barros, Helena Landau e outros, à entrega dos aeroportos e das críticas de setores da base do governo contra a volta das privatizações.


Para ele, “o modelo atual de privatizações é diferente do adotado no governo do presidente Fernando Henrique”. “A nossa concessão é diferente da praticada no governo Fernando Henrique, em que a lei estabelecia que as receitas arrecadadas com concessões e privatizações tinham a obrigação de serem usadas para pagar a dívida pública”, comentou. “A nossa forma de concessão não vai para superávit primário”, esforçou-se o ministro.

Mantega, assim, descartou a possibilidade dos R$ 24,5 bilhões obtidos com o leilão serem usados para reforçar o superávit primário, que é a economia de recursos que o governo faz para pagar os juros da dívida pública. Mas, pelos critérios do Tesouro Nacional, os recursos obtidos nos leilões são registrados como receitas primárias e, em princípio, poderão ser usados para abater os juros da dívida pública.

“Por lei, os recursos têm de entrar na conta única [do Tesouro Nacional], mas irão para esse fundo financiar novos investimentos no setor aeroportuário, principalmente nos aeroportos regionais, que têm rentabilidade menor e não são passíveis de concessão”, prometeu o ministro para logo em seguida acrescentar que os contingenciamentos deste ano serão “da mesma forma do ano passado, com ouhttp://www.blogger.com/img/blank.giftros valores, mas será dentro dos moldes do ano passado”. “Haverá superávit primário cheio e contingenciamento suficiente para gerar esse resultado”, declarou.

O fato é que esses recursos não vão ser destinados para aumentar o superávit primário neste ano de 2012. Até porque, mesmo se a equipe econômica pretender reforçar o superávit primário, isso só poderá ser feito a partir de 2013 porque o edital do leilão da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) estabelece que a primeira parcela do pagamento só será paga 12 meses depois da assinatura do contrato.


CARTA MAIOR


Privatização: ontem e hoje!
Apesar de haver permanecido durante muito tempo na pauta da agenda autenticamente liberal, a privatização só ganhou espaço e fôlego a partir de meados da década de 1970, quando aquilo que viria a ser conhecido como “Consenso de Washington” começou a realizar seus primeiros esboços.
Paulo Kliass

A surpreendente decisão da Presidenta Dilma em dar seqüência à proposta de privatização da estrutura aeroportuária brasileira reabriu o importante debate a respeito da complexa relação entre as esferas do público e do privado em nosso País.

Para aqueles que se recordam dos termos das polêmicas da campanha eleitoral para presidente em 2010, um ponto de inflexão foi justamente a postura ofensiva adotada pela então candidata do PT contra as propostas de privatização levadas a cabo pelo candidato tucano. Ou seja, votar no Serra era correr o risco da volta ao processo de transferência do patrimônio público ao setor privado. Porém, nada como um dia após o outro. E um ano após a sua posse, o governo Dilma comanda o leilão dos 3 principais aeroportos, cuja gestão até então era de responsabilidade da Infraero – empresa pública do governo federal.

Colocados na defensiva pelo tom inusitado do xadrez político, muitos simpatizantes do governo ensaiaram um discurso rechaçando a acusação e a cobrança de coerência. “De jeito nenhum! Concessão não é privatização!”. Ou então argumentando que os valores dos aeroportos leiloados foram bem superiores aos das empresas privatizadas no passado. Como se a questão ideológica estivesse superada e agora tudo não passasse de se encontrar a melhor forma para se chegar ao “preço justo” para realizar a transação entre o Estado e o capital. O esforço do malabarismo retórico impressiona! Afinal, realmente deve ser um pouco incômodo receber tantos elogios da parte de personalidades que estavam à frente do processo de privatização à época de FHC.

O fato é que o termo “privatização” comporta um conjunto enorme de definições. No entanto, considero que o mais adequado seria abordá-lo no sentido mais amplo, como o verdadeiro “processo de privatização”, que trata das relações entre as esferas do setor público e do setor privado. Apesar de haver permanecido durante muito tempo na pauta da agenda autenticamente liberal, a privatização só ganhou espaço e fôlego a partir de meados da década de 1970, quando aquilo que viria a ser conhecido como “Consenso de Washington” começou a realizar seus primeiros esboços. Ronald Reagan na Presidência dos EUA e Margaret Thatcher à frente do governo britânico foram os grandes patronos das medidas de demonização da presença do Estado na economia. E logo em seguida receberam o providencial apoio dos partidos socialistas recém chegados ao poder na França e na Espanha, que privatizaram boa parte dos respectivos setores públicos. Era o início da ascensão do neoliberalismo.

As empresas estatais e o início da crítica
Aqui por nossas terras, a realidade era um pouco diferente. Durante a fase da ditadura militar, como que por ironia da História (prefiro chamar de necessidades do capital...), a estrutura do Estado na economia se alargou e se aprofundou. Apesar da orientação direitista e conservadora do golpe de 64 e da crença liberal de seus principais formuladores de política econômica, o que se viu foi a continuidade da estruturação de setores estratégicos com forte presença do ente estatal. A energia era dominada pela Petrobrás, Nuclebrás, Eletrobrás e o sistema elétrico com empresas federais e estaduais. A siderurgia tinha como grande vetor a Siderbrás, com as principais empresas como CSN, Cosipa, Usiminas e demais. O sistema portuário era comandado pela Portobrás e suas unidades nas principais cidades do litoral. Na área de estradas de ferro, tínhamos a RFFSA federal e algumas empresas estaduais. No setor de petroquímica e de fertilizantes, o modelo dos pólos - como Camaçari e Cubatão - estimulava a formação de parcerias entre público e privado, por meio da Petroquisa e da Petrofértil. Nas telecomunicações, havia o sistema Telebrás com as operadoras estaduais e a Embratel federal.

No sistema financeiro, havia os bancos comerciais e os de desenvolvimento. De um lado, Banco do Brasil (BB), Caixa Econômica Federal (CEF) e o sistema dos bancos comerciais dos governos dos estados. De outro, BNDES e os bancos de desenvolvimento regional – BASA e BNB. Na mineração, o carro-chefe sempre foi a Cia. Vale do Rio Doce. Havia empresas de navegação fluvial, como a ENASA da Amazônia e a FRANAVE para o São Francisco. Na aeronáutica, a EMBRAER na produção de aeronaves. O sistema de água e saneamento urbano também sempre foi montado com base em empresas estatais, seja dos municípios seja dos estados.

Porém, apesar dessa aparente contradição, o modelo era bastante funcional ao processo de acumulação do capital. Do ponto de vista político, uma vez que o regime assegurava a exploração da força de trabalho e silenciava os opositores com os instrumentos da repressão. Do ponto de vista econômico, a fase do milagre reservava altas taxas de acumulação e de retorno para o capital privado. As primeiras queixas mais explícitas de representantes do empresariado começaram a surgir a partir da crise do início dos anos 80. Afinal, quando a economia entra em recessão, ninguém quer sair perdendo. O vilão passa, então, a ser identificado no setor público.

O Jornal da Tarde, ligado ao jornal “O Estado de São Paulo”, passa a publicar, em 1983, uma série de reportagens que ficou famosa. Tinha por título “República Socialista Soviética do Brasil” (sic) e buscava confundir de maneira ardilosa a luta pela democracia com a luta contra a presença do setor público na economia. Com comunistas, socialistas e demais representantes das forças progressistas assassinados, torturados, presos, exilados, a matéria tentava passar uma falsa imagem a respeito do projeto político do regime militar.

Através da divulgação exaustiva do suposto “gigantismo” das empresas estatais brasileiras e dos abusos cometidos pela ditadura, o jornal sugeria que a luta democrática pressupunha a saída do Estado na economia. Mas o termo mais utilizado naquele momento era a chamada proposta de “desestatização”. Apesar de um outro nome diferente para reduzir a presença do setor público, a essência da proposta era a mesma de hoje - a “privatização”.

Diferentes modalidades de privatização
As alternativas privatizantes podem ocorrer segundo um conjunto amplo de possibilidades operacionais. A primeira delas é o estereótipo mais evidente e consiste na venda pura e simples da empresa do Estado para os interessados do setor privado. O patrimônio da empresa estatal é transferido para o novo proprietário que paga um valor por tal operação.

Normalmente, o preço de venda deveria refletir o valor atual da empresa, adicionado do fluxo futuro de ganhos esperados. Na prática, porém, quase nunca foi assim. Os preços de venda eram reduzidos e os adquirentes recebiam mil e uma vantagens para a compra, como aceitação de títulos públicos sem liquidez (as chamadas moedas podres), aporte de recursos públicos (como financiamento do BNDES) e outras generosidades (como a participação de fundos de pensão ligados a empresas estatais).

Além disso, a realidade dos processos de privatização contém outras modalidades que não podemos deixar de considerar. As empresas estatais, por exemplo, dividem-se em empresas públicas e empresas de economia mista. No primeiro grupo, o Estado detém 100% das ações. No segundo grupo, há participação de acionistas privados também. A coisa fica mais complicada ainda se levarmos em conta a diferença entre as ações que dão direito a voto e as que não oferecem essa possibilidade. Ou ainda, as ações que dão direito a receber dividendos anuais do lucro da empresa e as que não permitem esse ganho. No caso do setor bancário, por exemplo, a CEF é uma empresa pública e o BB é uma empresa de economia mista.

Para os que agora resolveram fazer uma leitura mais “pragmática” da privatização, o governo poderia transferir até 49% do capital da Caixa sem problemas, pois ficaria tendo maioria no controle. E poderia vender a totalidade das ações ordinárias do BB sem direito a voto e as nominativas no limite de sua posição de majoritário.

Concessão é uma forma de privatização
No caso das concessões, o modelo de privatização é diferente. Não se trata de uma transferência definitiva do patrimônio estatal para o setor privado. E podemos estar face a situações bastante distintas. Um caso é o leilão da concessão de um bem público já em operação por entidade estatal. Outro seria a concessão de uma atividade nova que seria posta em operação pelo setor privado. E aqui a lista de casos para a realidade brasileira recente é enorme.

O governo FHC decidiu por abrir à iniciativa privada (grupos nacionais e estrangeiros) a concessão de exploração de poços de petróleo, o que antes era monopólio da Petrobrás. E esse modelo, antes tão criticado, acabou sendo digerido, absorvido e mantido pelos governos do PT. Está virando moda em todas as esferas da administração pública (federal, estadual e municipal) submeter à concessão da iniciativa privada a exploração econômica de diferentes tipos de serviço de saúde, como hospitais, centros de saúde, entre outros. Os governos estão realizando leilões para concessão a consórcios privados a administração de rodovias, mediante a cobrança de pedágios. Será que apenas por não haver a transferência “para todo o sempre” do patrimônio público para o privado, todos esses exemplos de transação negocial não se caracterizam como privatização? Afinal, se levarmos em conta o tempo médio de vida das empresas no Brasil, os 30 anos da concessão dos aeroportos é mais do que uma eternidade! Quem sobreviver até 2042 certamente assistirá à cerimônia de retorno do patrimônio dos aeroportos à União...

Além disso, a mercantilização dos bens públicos é também uma forma evidente de privatização desses setores. O ensino superior virou um grande negócio para o setor, sem que as universidades públicas tenham sido vendidas. Bastou o governo estimular o crescimento das vagas nas faculdades privadas, seja por programas do tipo PROUNI, seja pelo estrangulamento dos orçamentos da rede das universidades públicas. Tanto é que há hoje grandes grupos estrangeiros operando no ramo de vendas de diplomas de ensino superior por aqui. Já a expansão da rede privada de saúde é estimulada pelo sucateamento da estrutura da saúde pública, via SUS. A transformação da saúde e da educação em mercadorias faz com que esses setores passem a ser tratados segundo a lógica do capital e não aquela do interesse público. E isso significa também um processo de privatização de tais atividades, sem que haja nenhuma venda de empresa estatal.

Não há razão para privatizar
O ponto mais intrigante é a busca das razões que teriam levado o governo da Presidenta Dilma a tal mudança de postura. Afinal, os argumentos favoráveis à privatização podem ser resumidos a 5 tipos:

i) “ideológico puro”: sou contra o Estado na economia, isso é função de empresa privada e ponto final;

ii) ineficiência do Estado: a ação econômica do Estado é sempre ineficiente, em relação ao setor privado. Assim, para que o conjunto dos atores sociais saia sempre ganhando, a solução é privatizar;

iii) necessidade de promover a concorrência: boa parte das empresas estatais opera em setores onde não há concorrência. Abrir à privatização seria uma forma de estimular a eficiência, melhorar os serviços e reduzir as tarifas cobradas do consumidor;

iv) a presença do Estado só se justifica em setores considerados estratégicos e essenciais;

v) necessidade de recursos: o Estado estaria com dívidas elevadas e sem recursos financeiros para cumprir suas missões essenciais. A solução é vender o patrimônio público para o setor privado e usar esses recursos para tais fins.

Assim, vejamos o caso do Brasil de hoje, de acordo com os postulados acima:

i) poucos liberais radicais arriscariam tal opção hoje em dia;

ii) o argumento da ineficiência quase sempre é utilizado de forma oportunista e casuísta. Assim, o esforço deve ser no sentido de aperfeiçoar a gestão da coisa pública e não transferi-la para o setor privado. Caso contrário, a lista das empresas e setores a serem privatizados só deveria aumentar. Na verdade, muitos temem que a Infraero seja um balaio de ensaio para outros experimentos mais “ousados”;

iii) a realidade pós-privatização de teles, energia elétrica, estradas, entre outros, mostra a falácia do argumento. Os serviços são de péssima qualidade, as tarifas elevadas e os setores não permitem uma concorrência do tipo do “mercado da batatinha”. Não gostou dos serviços da companhia de eletricidade? Ótimo, vá então procurar aquele fio no poste lá do outro lado da calçada. O pedágio da estrada está muito elevado? Pode pegar a via esburacada ali ao lado, que ela é de graça. Isso para não mencionar o nível absurdo das tarifas, inclusive na comparação com outros países;

iv) realmente entre os extremos das barracas de frutas na feira e a promoção da segurança pública, há um conjunto amplo de setores que podem ser considerados estratégicos ou não, de acordo com o momento histórico, a realidade de cada país e a opinião de cada indivíduo. Mas, com certeza, a gestão aeroportuária desempenha uma função relevante aqui no Brasil. Afinal, se não fosse assim tão estratégica, por que tanta preocupação com o chamado “caos” aéreo? Por que tanta energia despendida com a busca de uma solução a toque de caixa, a partir de uma simples exigência da FIFA? Além de elementos de segurança nacional (espaço aéreo entre os oceanos Atlântico e Pacífico, espaço de dimensão continental, conexão do território nacional, etc), os aeroportos proporcionam cada vez mais um importante meio de comunicação e transporte em nosso País. É realmente um setor essencial.

v) o Estado brasileiro tem recursos financeiros sobrando. O problema é que quase 50% do Orçamento vão para pagamento de juros e serviços da dívida pública. Apenas a título de comparação: o governo comemorou os R$ 35 bilhões que serão desembolsados em lentas e suaves prestações ao longo de 30 anos pelos consórcios dos aeroportos. Pois a Presidenta, de uma só canetada, cortou R$ 60 bi dos gastos da União em 2012 para gerar o famigerado superávit primário.

Afinal, então, por que privatizar?

Paulo Kliass é Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal e doutor em Economia pela Universidade de Paris 10.


CARTA MAIOR

Privatização dos aeroportos: capitulação surpreendente
Petistas recorrem a argumentos pouco claros e tucanos capitalizam leilão. As concessões não têm base em argumentos objetivos. É pura ideologia em tempos de desmoralização do neoliberalismo e de crise nos países ricos.
Gilberto Maringoni

Belo Horizonte, 28 de novembro de 1999, fim de tarde. A maioria dos delegados eleitos para o II Congresso do Partido dos Trabalhadores aprova uma série de resoluções reunidas no documento O Programa da Revolução Democrática para a construção de um Brasil livre, justo e solidário. Entre elas, uma diz o seguinte:

As privatizações têm representado uma gigantesca transferência de renda do setor público para o privado. Os preços de venda foram aviltantes, muitas vezes financiados com recursos do Estado. Os efeitos sobre o crescimento da economia são inexistentes, com resultados irrelevantes no abatimento das dívidas interna e externa. (...) O PT reafirma sua posição pela suspensão imediata do Programa Nacional de Privatizações.

Nas eleições de 2006, o então candidato petista Luiz Inácio Lula da Silva literalmente triturou seu oponente Geraldo Alckmin no primeiro debate do segundo turno com uma saraivada de ataques às privatizações. A população entendeu o que estava em jogo, após conviver por anos a fio com serviços de má qualidade e preços altos praticados especialmente pelas concessionárias de energia e telefonia.

Em 2010, utilizando discurso semelhante, a então candidata Dilma Rousseff fulminou seu adversário José Serra no debate da TV Bandeirantes, como se vê neste vídeo.

Acrobacias ideológicas
Pouco mais de um ano após as eleições presidenciais, o governo petista decide privatizar os três mais rentáveis aeroportos do país. Quase 90% do montante a ser desembolsado pelas empresas ganhadoras do leilão serão financiados pelo BNDES. Cenas de empresários e investidores segurando um martelo, que pareciam relegadas a um passado distante, se repetiram diante de telas e páginas da imprensa.

O mercado e a mídia comemoram. E os petistas tentam justificar as acrobacias em suas teses.

Os líderes do partido se esmeram em um admirável contorcionismo verbal para dizer que não é bem assim, que não se vendeu nada, o que aconteceu foi uma concessão, o patrimônio continua público, as tarifas vão cair e que o feito demonstra a confiança que nosso país granjeia diante de um mundo em crise.

O deputado Marco Maia (PT-RS), presidente da Câmara, se superou. Suas palavras foram captadas pelo jornal O Globo: “Uma coisa é privatização no setor de energia, de mineração, outra é tratar de concessão em setores que não são tão importantes, estratégicos para a economia. Os aeroportos não têm valor tão estratégico”.

É impressionante! Para os Estados Unidos, país do liberalismo, os aeroportos são tão vitais que toda a gestão é estatal. E se aqui não têm não têm valor estratégico, para que toda a preocupação com caos aéreo, pane nos serviços durante a Copa e presença do BNDES no leilão?

Caso o pensamento de Maia prospere, estará absolvida a maioria das privatizações dos governos FHC, realizadas sob o regime de concessão e financiadas também pelo BNDES. As desestatizações das empresas de energia, telefonia, saneamento, gás e transportes (ferrovias) foram realizadas através de concessões por tempo determinado.

Nada garante que investimentos virão, como chegou a dizer o deputado José Guimarães (PT-CE), assim como não chegou dinheiro novo para modernizar a rede elétrica e a de telecomunicações. No caso da banda larga, por exemplo, as concessionárias só investirão na ampliação do serviço após uma série de desonerações tributárias patrocinadas pelo governo . Aliás, a experiência recente mostra que as empresas estrangeiras concessionárias de serviços públicos preferem remeter lucros às suas matrizes em dificuldades a colocar recursos nas subsidiárias brasileiras.

Capitulação petista
Mais importante que as filigranas conceituais externadas pelos líderes petistas é a defesa que fazem de uma sólida posição ideológica. A mesma, aliás, brandida pelos dirigentes tucanos.

A concessão dos aeroportos não tem base em argumentos objetivos. O Estado tem dinheiro. Mas 47,19% de seu orçamento é direcionado para o pagamento dos juros e serviços da dívida pública, de acordo com dados da organização Auditoria Cidadã.

Por trás da cessão á iniciativa privada está a velha idéia de que o mercado é superior ao Estado para administrar o que quer que seja. E que precisamos de firmas estrangeiras –superiores a nós - para gerir também o que quer que seja.

Em síntese, volta o mercadismo e o complexo de viralatas.

Esta é a grande disputa feita ao longo dos últimos anos na sociedade brasileira. E é também o grande prejuízo – ideológico, para repetir um conceito tido como fora de moda – cometido pelo governo federal.

O PT confessou com grande alarde uma capitulação às teses de seus adversários. Capitulação inexplicável, por dois motivos: 1. Acontece quando o PSDB vive sua pior crise de rumos e de falta de lideranças e 2. É feita quando as idéias básicas do neoliberalismo são desmoralizadas pela crise européia.

Capitalização tucana
O ex-Ministro das Comunicações do governo FHC, Luiz Carlos Mendonça de Barros, não se deixou levar pelas piruetas verbais dos petistas e capitalizou o ocorrido. Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, ele foi direto ao ponto: “O mais importante desse leilão é que ele marca a volta da privatização como instrumento legítimo e eficiente para aumentar os investimentos na infraestrutura”. E mais adiante, emenda: “A lógica intrínseca dos contratos de concessão é a mesma [do governo FHC]: um grupo privado, explorando os serviços comercialmente segundo seus objetivos de eficiência e lucratividade, mas balizado por regras estabelecidas pela Anac”.

Mais objetiva ainda foi a economista Elena Landau, uma das principais formuladoras das privatizações dos anos 1990, em seu twitter: “Hoje é dia muito importante: o debate sobre privatizações se encerrou... E nós ganhamos”.
O PT cresceu muito, tornou-se o maior partido brasileiro, ganhou as três últimas eleições presidenciais e provavelmente ganhará a próxima.
Mas entregou os pontos na batalha das idéias.
Gramsci chamava isso de “transformismo”.
Seja o que for, é triste.

Gilberto Maringoni, jornalista e cartunista, é doutor em História pela Universidade de São Paulo (USP) e autor de “A Venezuela que se inventa – poder, petróleo e intriga nos tempos de Chávez” (Editora Fundação Perseu Abramo).



CHICO ALENCAR- CONGRESSO EM FOCO

Muita comemoração pela privatização dos três primeiros aeroportos brasileiros. Na mídia grande, unanimidade. No plano político, tucanos celebram a rendição do PT ao modelo antes tão criticado. E petistas – já sem se avexar por contrariar, mais uma vez, o discurso de campanha – dizem que ‘não é bem assim’…

O que será, na verdade? A porta para a melhoria efetiva do serviço à população viajante – não apenas em função da Copa de futebol – está aberta? O voo privatista dos espaços de pouso da aviação civil terá turbulências ainda não mencionadas, pois suas ‘escalas’ são de alto risco. Eis algumas:

1) O grande avalista da privatização é o dinheiro público, com o BNDES financiando os consórcios privados em obras, máquinas e equipamentos. Fundos de pensão de estatais – como Previ, Petros e Funcef – também entraram no negócio. Não seria melhor garantir recursos para a própria Infraero, que, por sua natureza, está sob mais controle da sociedade?

2) Os consórcios privados pagarão os ‘admiráveis’ R$ 24,5 bilhões não de imediato, mas ao longo de 12 a 20 anos, e só começarão a quitar a ‘concessão’ em meados de 2013;

3) Empresas privadas têm, como é de sua natureza, compromisso prioritário com o lucro, e não com o bem estar dos usuários;

4) Os ágios pagos revelam, sobretudo, que o governo subestimou os valores dos aeroportos – construídos, aliás, com recursos públicos;

5) Guarulhos ficará com um grupo transnacional cujo principal operador é uma empresa da África do Sul; Viracopos, com uma francesa; Brasília, com uma argentina. Detalhe relevante: o histórico dessas empresas no setor de modernização e administração de aeroportos não é nada significativo;

6) Os aeroportos privatizados são os mais rentáveis do Brasil. A Infraero, que administra 66 dos 130 aeroportos do Brasil, trabalha com dimensão federativa, em sistema interligado. Coloca recursos derivados dos mais rentáveis para outros com precariedades. Os consórcios privados que controlarão os três grandes – 30% dos voos de passageiros, 57% dos de carga – não têm qualquer compromisso com a malha geral do Brasil;

7) Os recursos da privatização vão para o Fundo Nacional da Aviação Civil. Mas, como reza a lei 1193 de 2009, podem ser destinados para o superávit primário voltado ao pagamento de juros e serviços da dívida, que consumiram, ano passado, 45,5% do Orçamento da União;

8) As empresas de aviação já anunciam aumento das tarifas aéreas: o que tende a acontecer é que a privatização, cuja justificativa é a melhoria dos terminais, venha a reduzir a demanda de usuários, ao tornar tudo mais caro nos “aeroshoppings” e embarques;

9) Em todos os países do mundo, os aeroportos – e não só os de bases militares – são espaços importantes na defesa da soberania nacional, que ficará agora, no Brasil, refém dos interesses negociais transnacionais;

10) Paulatinamente, funcionários da Infraero, com grande experiência – empresa pública considerada em 2011 a 2ª melhor gestora de aeroportos do mundo – serão descartados e substituídos por outros, sem o seu acúmulo. Quem assegura que isso não poderá afetar inclusive a segurança de passageiros e tripulantes?

Apesar do foguetório, não há ‘céu de brigadeiro’ previsível, e sim muitas zonas de turbulência…

Infraero bancará 49% dos 24 bi “arrecadados” com privatização

Sociedade alivia grupos privados que, além de 51% do controle dos aeroportos, têm garantido metade das outorgas pela estatal

A privatização dos aeroportos de Guarulhos, Campinas e
Brasília se mostrou, sob todos os aspectos, um tremendo prejuízo para o país. Além de repassar o controle para grupos privados dos aeroportos mais rentáveis, junto com o Galeão, a privatização ainda vai obrigar a Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) a bancar 49% do pagamento das outorgas de R$ 24,535 bilhões. Ou seja, a estatal vai desembolsar cerca de R$ 12 bilhões para perder o controle desses aeroportos.

Segundo informou a própria Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), os valores serão pagos pelas três sociedades de propósito específico (SPEs) – empresas privadas -, formadas pelos consórcios vencedores dos leilões de cada aeroporto, com 51% do controle, e a Infraero com 49%: “A Infraero só é impactada pelo pagamento da contribuição quando da aferição dos resultados da concessão. Logo, os pagamentos das contribuições são devidos pela concessionária e deverão sair de seu caixa, independentemente de sua composição societária”.

A partir de 2013, o pagamento do valor do leilão será efetuado em parcelas anuais ao longo dos diferentes prazos de concessão, corrigidas pelo IPCA, ao Fundo Nacional de Aviação Civil (FNAC). Os recursos sairão das receitas geradas nos aeroportos, advindas de tarifas cobradas de companhias aéreas e de passageiros, estacionamentos, hotéis e aluguel de lojas. Ou seja, dessas receitas, primeiramente serão pagas as parcelas das outorgas e de investimentos, para depois se distribuir os lucros. Contudo, ao vender os aeroportos mais lucrativos corre-se o risco de o Estado brasileiro ter de injetar dinheiro nos aeroportos que não são lucrativos, 55 ao todos, bancados atualmente pelos 12 que dão lucro, entre os quais os três já privatizados.

Com o dinheiro da Infraero já garantido, uma vez que o edital da Anac estabeleceu que a estatal entraria com 49% dos recursos, os consórcios se sentiram livres para elevar as ofertas pelos aeroportos, com preços mínimos para lá de subavaliados. Assim, a Invepar – formada pela OAS e os fundos de pensão Previ, Petros e Funcef, juntamente com a estatal sul-africana ACSA - adquiriu o aeroporto de Guarulhos por R$ 16,213 bilhões, cujo preço mínimo era de R$ 3,4 bilhões.

O aeroporto de Brasília foi empalmado pelo consórcio formado pelo grupo Engevix e pelo argentino Corporación América, por R$ 4,5 bilhões, que tinha um preço mínimo fixado em R$ 582 milhões. Viracopos foi açambarcado pelo consórcio formado pela Triunfo Participações, UTC Participações e a francesa Egis Airport Operation por R$ 3,8 bilhões, com preço mínimo de R$ 1,5 bilhão.

É bom registrar que a Infraero não participou dos leilões, não fez lance nenhum e ainda terá que arcar com o ensalsado ágio médio de 347% na privatização dos aeroportos.

Em resposta uma reportagem da revista Veja, a Infraero demonstra que não havia necessidade nenhuma em privatizar os aeroportos, que teve como um de seus pretextos a realização da Copa do Mundo. Diz a estatal que estavam previstos investimentos “da ordem de R$ 6,4 bilhões – constantes do PAC - até 2014 em aeroportos relacionados com a Copa-2014 e demais aeroportos”.

Sobre a acusação da revista de que o Estado brasileiro não teria “capacidade nem recursos em volume suficiente para custear as obras de ampliação dos aeroportos já existentes e para a construção de novos”, a Infraero afirmou: “É, no mínimo, controverso afirmar que o Estado brasileiro não tem capacidade para construção de novos aeroportos no ritmo exigido pela demanda atual e futura, se a Rede existente foi totalmente construída por este mesmo Estado, por meio da mesma Infraero. Por outro lado, não há falta de recursos, que estão assegurados para os investimentos a curto, médio e longo prazos”.

Segundo o presidente do Sindicato Nacional dos Aeroportuários (SINA), Francisco Luiz Xavier de Lemos, “a questão dessas privatizações é que toda a rede Infraero que é composta por 67 aeroportos, 83 grupamentos de navegação aérea, diversos terminais de carga, tudo isso é garantido sem aporte nenhum do governo, é tudo com recurso próprio, da própria Infraero. E só 12 aeroportos brasileiros são lucrativos”.

No mundo, 85% dos aeroportos são administrados pelo Estado. A Infraero é a segunda maior operadora de aeroportos em número de terminais e terceira em número de passageiros.

Para viabilizar os leilões, os aeroportos de Cumbica (Guarulhos), Viracopos (Campinas) e Juscelino Kubistchek (Brasília) foram incluídos no Programa Nacional de Desestatização (PND), através do O Decreto nº 7.531/2011.

VALDO ALBUQUERQUE - JORNAL A HORA DO POVO

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